Publicidade

Doce para relaxar? Cuidado, alimentação rica em açúcar age como gatilho para doenças mentais

Segundo o médico psiquiatra e nutrólogo, Frederico Porto, alimentos ricos em açúcar, que são utilizados como válvula de escape para o estresse, podem também favorecer doenças mentais como depressão e ansiedade

Quantidade de açúcar pode estar relacionado com piora da saúde mental – Pexels/mali maeder

A relação entre doenças mentais e alimentação fica cada vez mais clara com o passar do tempo, mostrada por evidências clínicas e estudos científicos. E isso vale para ambos os sentidos: tanto a comida como válvula de escape para lidar com a doença (ansiedade, por exemplo), quanto favorecer doenças psiquiátricas, como depressão e ansiedade.
 
O médico psiquiatra e nutrólogo, Frederico Porto, explica ser muito frequente que, durante picos de estresse, – cada vez mais comuns no mundo moderno e que se exacerbaram durante a pandemia de covid-19 – as pessoas tendem a descontar na comida, geralmente ingerindo alimentos ricos em açúcar.
 
O Brasil é o 4º maior consumidor de sacarose do mundo, de acordo com levantamento recente da Sucden. A recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) é que apenas 10% dos alimentos consumidos por dia venham do açúcar, mas os brasileiros costumam consumir 16,3%.
 
O consumo ocorre, segundo Porto, por um mecanismo bioquímico natural. O médico psiquiatra explica que, sob estresse, o corpo produz adrenalina, hormônio que funciona como um mecanismo de defesa para que a pessoa fuja de perigos. “Automaticamente, é secretado no sangue glicose, substância que fornece energia ao corpo para reagir àquilo que sente como ameaça”, diz.

Publicidade

+++ 10 hábitos considerados saudáveis que podem ter um efeito contrário

+++ ‘Boom’ de vitamina C! Além da laranja pera e lima, existem outros tipos da fruta; veja quais são

No período paleolítico, quando o homem vivia ao sabor da sorte, sujeito aos mais variados tipos de ameaças físicas, como o ataque de um animal selvagem, por exemplo, esta glicose era totalmente utilizada para que ele lutasse contra o predador ou fugisse dele. “Mas os nossos fatores desencadeantes de estresse na atualidade são, geralmente, tarefas que são resolvidas com mais pensamento do que ação. Então, hoje em dia costumamos despender menos energia do que o homem primitivo”, explica Porto.
 
Quando a pessoa termina de resolver um relatório ou de escrever um e-mail que a deixou tensa, continua o médico psiquiatra, ainda há muita glicose disponível em seu sangue. O corpo, então, reage secretando insulina, hormônio responsável por controlar a glicose no organismo. O problema é que ao fazer isso, em um intervalo curto de tempo, a fome aparece, pois o corpo precisa de energia. “É nesta hora que vem a vontade de comer um doce”, comenta.
 
O grande problema, segundo o nutrólogo, é que o açúcar é de rápida absorção. “Ao ingerir alimentos com muita glicose, logo secretamos bastante insulina para controlar a quantidade dessa substância no organismo. A glicose vai embora e em cerca de meia hora estamos com fome novamente. Forma-se um ciclo vicioso”, destaca.
 
A professora e palestrante Kátia Carvalho conta que o açúcar foi um dos principais motivos para que ela adoecesse. “Estava com sobrepeso, falta de ar e dores no corpo. Achei que era algo normal, porém tive um AIT e tive que fazer uma cirurgia cerebral de urgência, quando acordei decidi que precisava mudar minha vida, senão não a teria mais”. Kátia parou o consumo de farinhas e glicose. Após 2 anos está 36 kg mais magra e sem nenhuma probabilidade de voltar a ter problemas cardíacos e cerebrais. “Minha cardiologista brinca comigo falando que comparando os exames parece que está analisando duas pessoas diferentes”.
 
Para quebrar essa associação entre estresse e comida, o Dr. Frederico Porto recomenda que as pessoas adquiram o hábito de ingerir alimentos com índice glicêmico maior, que são aqueles absorvidos mais lentamente pelo organismo, mantendo os níveis de açúcar no sangue em um nível ideal. Entre alimentos desse tipo estão: laticínios, leguminosas, vegetais, oleaginosas e alguns cereais integrais, como aveia, arroz, milho e quinoa.
 
Como a má alimentação pode causar doenças mentais
 
“A mente e o corpo estão interligados, então uma alimentação de baixa qualidade tende a favorecer o desenvolvimento de doenças mentais”, afirma o médico psiquiatra. Isto ocorre, conforme Porto, porque alimentos industrializados, ultraprocessados, refinados, ricos em carboidratos e pobres em vitaminas e minerais, quando ingeridos em excesso, causam no indivíduo um estado pró-inflamatório. Esta inflamação, subclínica e sutil afeta todo corpo – acarretando aumento de peso e resistência à insulina, que vai levar à diabetes – inclusive o cérebro, podendo acarretar doenças mentais.
 
Porto explica que quando o corpo está em estado pró-inflamatório, substâncias chamadas citocinas (proteínas que modulam a função das células) atravessam a barreira hematoencefálica – uma espécie de filtro entre os vasos cerebrais e o próprio cérebro – e acabam por inflamar também o cérebro, favorecendo o surgimento de doenças.
 
Conforme o médico psiquiatra, há indícios de que a depressão, por exemplo, é decorrente deste processo inflamatório. “Seria uma das razões porque o ácido graxo ômega 3, que é anti-inflamatório, funcionaria para mitigar sintomas de depressão”, diz.
 
No que diz respeito à ansiedade, uma má alimentação pode ser um dos fatores para acarretar esta doença psiquiátrica por tornar o corpo menos resiliente devido à inflamação. “Com menor capacidade de adaptação, a capacidade que o organismo tem de lidar com o estresse diminui drasticamente, o que aumenta as chances do desenvolvimento de quadros ansiosos”, explica Porto.
 
Para buscar mitigar o desenvolvimento de doenças mentais, o nutrólogo recomenda evitar o consumo de alimentos industrializados e refinados, com carboidratos de rápidas absorção, como pães, massas, sucos e doces, e também priorizar a ingestão a chamada “comida de verdade”, composta por alimentos naturais.
 
Peixes e linhaça, por exemplo, como destaca Porto, são abundantes em ômega-3, a chamada gordura boa, que além de ser anti-inflamatório, torna a membrana do neurônio mais fluida, facilitando a troca de neurotransmissores como a serotonina, substância responsável pela regulação do humor, sono, apetite, ritmo cardíaco, temperatura corporal, sensibilidade e funções cognitivas. A baixa concentração de serotonina no organismo pode causar, além de mau humor e dificuldade para dormir, problemas como ansiedade ou mesmo depressão.
 
Já alimentos como legumes e verduras, principalmente folhas verdes, como a couve, são ricos em vitaminas B2, B6, B12, zinco e ácido fólico, na sua forma ativada, chamada metilfolato. Conforme o nutrólogo, estes micronutrientes são muito importantes para que o corpo faça a metilação, reação química responsável pela produção de dois neurotransmissores muito importantes ao cérebro: a serotonina e a dopamina. Esta última responsável por levar informações a várias partes do corpo, provocando sensação de prazer, que leva a motivação.


Perfil do Dr. Frederico Porto

Publicidade

Formado em medicina pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com especialização em psiquiatria pelo Hospital das Clínicas da mesma universidade, apresenta ainda a formação de nutrólogo pela Associação Brasileira de Nutrologia (Abran). Atua como professor convidado da Fundação Dom Cabral, em Belo Horizonte, e consultor sênior associado a consultorias internacionais. É palestrante in company e autor de dois livros.