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Cronoterapia: quimio de manhã pode dar sobrevida de até 6 meses a mais a paciente com tumor cerebral

Estudo publicado no periódico Neuro-Oncology Advances fortalece o que vem sendo chamado de cronoterapia, ou o uso de medicamentos em horários que eles farão mais efeito. No trabalho, pacientes com glioblastoma, um tipo grave de tumor cerebral, tiveram sobrevida maior

Médico explicou estudo que destaca os benefícios da cronoterapia no tratamento contra câncer – Unsplash/ Robina Weermeijer

Um tipo agressivo de câncer cerebral, glioblastoma, não tem cura e os pacientes sobrevivem em média 15 meses após o diagnóstico, com menos de 10% dos pacientes sobrevivendo por mais de cinco anos. Enquanto os pesquisadores estão investigando novas terapias potenciais por meio de ensaios clínicos em andamento, um novo estudo da Universidade de Washington em St. Louis, publicado em abril no periódico Neuro-Oncology Advances, sugere que um pequeno detalhe no tratamento padrão atual, administrando quimioterapia pela manhã em vez de à noite, poderia adicionar alguns meses para a sobrevivência de algum dos pacientes.

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“A cronoterapia é uma abordagem inovadora e um novo tópico de interesse em Oncologia, por recentes estudos demonstrarem que nosso corpo não funciona da mesma forma em todos os períodos do dia, o que pode influenciar em como os remédios atuam no nosso corpo. Ela está sendo testada para melhorar a sobrevida por meio da entrega programada de tratamentos anticâncer de acordo com o ritmo diário do paciente. Nesse estudo, a droga Temozolomida (TMZ), agente quimioterápico padrão para glioblastoma (GBM), foi aplicado em horários diferentes e o resultado sugere que o uso do medicamento pela manhã estendeu o tempo de vida dos pacientes que tinham uma alteração na molécula MGMT”, explica o Dr. Gabriel Novaes de Rezende Batistella, médico neurologista e neuro-oncologista, membro da Society for Neuro-Oncology Latin America (SNOLA).

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“A temozolomida foi aprovada para tratar o glioblastoma em 2005. Portanto, qualquer melhora na sobrevida é bastante significativa, sendo que a terapia padrão não evoluiu significativamente desde 2005”, acrescenta o médico.

A sobrevida global média para todos os pacientes no estudo foi de cerca de 15 meses após o diagnóstico. “Mas aqueles que receberam o medicamento de quimioterapia temozolomida pela manhã e que tinham alteração do MGMT tiveram uma sobrevida global média de mais de dois anos, em comparação com uma sobrevida global média de cerca de 13 meses e meio para aqueles que tomaram o medicamento à noite, uma diferença estatisticamente significativa neste estudo, que tem como importante limitação ser um estudo retrospectivo e com um número pequeno de pacientes”, explica o neuro-oncologista.

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“Os dados ainda são imaturos, portanto, mais estudos poderão fortalecer essa expectativa. Mas temos que considerar também o bem-estar do paciente. No período de quimioterapia com radioterapia, pedimos que o paciente tome Temozolomida 1 hora antes da sessão de radioterapia. Em pacientes na fase adjuvante, isto é, após a radioterapia (fase dos ciclos), alguns podem optar por tomar o remédio pela manhã, mas caso sintomas atrapalhem o dia do paciente, preferimos que ele volte a usar o medicamento à noite, antes de dormir, para evitar sintomas ao longo do dia”, pondera o médico.

Ainda não há cura para esse câncer mortal e, no momento, os estudos se concentram em desenvolver melhores tratamentos, mas também em prolongar a sobrevida dos pacientes, levando em consideração também a qualidade de vida, segundo o médico neuro-oncologista. “Esses resultados são empolgantes porque sugerem que podemos estender a sobrevivência simplesmente dando nossa quimioterapia padrão pela manhã, algo extremamente simples de ser implementado.

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Até agora, poucos casos clínicos descritos na literatura científica consideram a hora do dia para tomar medicamentos. “O interesse na cronoterapia é algo muito recente para médicos oncologistas e cientistas, novos estudos vão direcionar a necessidade de começarmos a questionar qual o melhor momento para entregar quimioterapia para o paciente. Possivelmente muito do que iremos ler nos próximos meses ou anos irá vir de estudos mais simples, até que estudos com a real intenção de comparar tal iniciativa sejam implementados, o que pode demorar. Ainda não é hora de afirmar, com certeza, de que esta é a melhor forma de tratar, mas pode ser uma conduta aceitável no consultório, por não prejudicar o paciente e nem mudar a terapia padrão”, explica o médico.

Como foi feito o estudo

Neste estudo retrospectivo, os pesquisadores analisaram dados de 166 pacientes com glioblastoma que foram tratados no Siteman Cancer Center no Barnes-Jewish Hospital e na Washington University School of Medicine entre janeiro de 2010 e dezembro de 2018. Todos os pacientes receberam o tratamento padrão para glioblastoma.

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Eles foram submetidos à cirurgia para remover o máximo possível de cada tumor e, em seguida, receberam radioterapia junto com o medicamento quimioterápico temozolomida. Após a conclusão do regime de radiação e temozolomida, os pacientes continuaram a tomar uma dose de manutenção de temozolomida – administrada em cápsula oral – pela manhã ou à noite, dependendo da preferência de seus oncologistas.

Segundo o estudo, muitos neuro-oncologistas preferem administram o medicamento à noite porque os pacientes tendem a relatar menos efeitos colaterais, o que também foi notado no estudo. “Mas os pesquisadores levantaram a hipótese de que o aumento dos efeitos colaterais – que podem ser controlados com outras terapias – seria um sinal que a droga está funcionando de forma mais eficaz. De qualquer forma, mais estudos ainda precisam ser feitos”, finaliza o Dr. Gabriel.


FONTE:

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*DR. GABRIEL NOVAES DE REZENDE BATISTELLA: Médico neurologista e neuro-oncologista, membro da Society for Neuro-Oncology Latin America (SNOLA). Formado em Neurologia e Neuro-oncologia pela Escola Paulista de Medicina da UNIFESP, hoje é assistente de Neuro-Oncologia Clínica na mesma instituição. O médico é o representante brasileiro do International Outreach Committee da Society for Neuro-Oncology (IOC-SNO).